quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Violência x Estatuto do Torcedor: a lei tem que ganhar esta briga!

POR EDUARDO CARLEZZO*
É absolutamente inadmissível e inaceitável que o futebol nacional esteja se tornando cada vez mais refém da violência selvagem protagonizada por bandidos travestidos de torcedores.
Não há a meu ver, neste momento, nenhum item mais importante para a agenda dos próximos 10 anos do futebol brasileiro do que a implantação de uma política de combate à violência. De que adianta termos alguns dos mais modernos estádios do mundo se simplesmente as pessoascivilizadas não vão aos jogos por temerem por sua integridade física?
O Estatuto do Torcedor, desde 2010, inclui entre seus dispositivos a criminalização de determinas condutas praticadas por torcedores dentro e fora dos estádios. Invadir o campo de jogo ou brigar dentro do estádio pode resultar em uma pena de reclusão de 1 a 2 anos e multa. Contudo, o ofensor poderá ter a pena convertida em proibição de comparecer aos estádios por um período entre 3 meses e 3 anos na hipótese de ser primário, ter bons antecedentes e não ter sido punido anteriormente pela prática destas condutas.
Ocorre que tais proibições de frequentar estádios tem se mostrado absolutamente ineficazes e desprovidas de sentido prático. Primeiro, porque as penas não estão sendo aplicadas e quando são aplicadas são brandas. Exemplo: o “torcedor” que invadiu o gramado em Recife em um jogo entre Fluminense e Botafogo levou 90 dias de proibição. Segundo, porque na maior parte dos casos os punidos não estão respeitando tal pena. Exemplo: o caso deste citado “torcedor”e de vários outros que postam suas fotos dentro dos estádios nas redes sociais, mesmo banidos. E terceiro, não existe comunicação entre Judiciário e Polícia para a fiscalização do cumprimento de tais penas. Ou seja, caíram no vazio e ninguém respeita. Simples assim.
Precisamos de uma política de tolerância zero no combate aos marginais que afugentam dos estádios as famílias e as pessoas de boa índole. Será necessário que cheguemos ao fundo do poço, como na Argentina, para que os governos comecem a pensar sobre o assunto de forma racional e estruturada? Sou favorável a uma mudança no Estatuto do Torcedor em que, além da pena criminal a ser aplicada ao ofensor, ele seja imediatamente banido dos estádios pelo período de 3 anos. No mínimo.
O exemplo inglês deve ser chamado mais uma vez. Lá, o governo criou a Football Banning Orders Authority com a finalidade de manter um registro de todas as pessoas banidas dos estádios e cooperar com a polícia para a fiscalização do cumprimento das penas. Ainda, o governo inglês estabeleceu a UK Football Policing Unit, a qual pode ser chamada de “Polícia do Futebol”. Trata-se de um belo exemplo em que combater a violência nos estádios tornou-se uma política de Estado.
A violência que toma conta do nosso futebol, em especial praticada pelas torcidas organizadas, já passou a muito tempo do limite do aceitável. Ou o Governo Federal eGovernos Estaduais acordam e passam a encarar este assunto com a seriedade e rigidez que merece, ou este será apenas mais um setor da sociedade a sucumbir diante da violência que assola este país
*Eduardo Carlezzo, advogado, secretário da Comissão de Direito Desportivo do Conselho Federal da OAB e presidente da Associação Sul-americana de Advogados do Futebol

O futebol, a vida e a dignidade.

POR JORGE LUIZ SOUTO MAIOR*
A morte do jovem boliviano de 14 anos, Kevin Espada, em uma partida de futebol, após ser atingido por um sinalizador naval, que tem a capacidade de atingir 300 metros em 3 segundos, impõe-nos a produção de uma racionalidade que reconheça o total absurdo da situação, que foge de qualquer parâmetro de civilidade, e que conduza o convívio nos estádios a outro patamar. A identificação dos culpados diretos, atribuindo-lhes uma punição, com respeito aos preceitos jurídicos da ampla defesa, é essencial, mas não é o bastante, pois, há de se reconhecer, não se trata de um fato isolado ou da ação exclusiva de um ou de alguns poucos torcedores. A atitude de uma pessoa de levar a um estádio de futebol um artefato como o que gerou a tragédia está integrada ao contexto da grave distorção que se instalou nos estádios de futebol (e fora deles) no sentido de que a violência, individual ou coletiva, está justificada pelo impulso do ato de torcer.
Do ponto de vista específico, é importante consignar que ninguém pode ser condenado sem a plena possibilidade de se defender, exigindo-se a necessária apuração dos fatos, mas é impossível não deixar de destacar a enorme afronta à convivência humana que constitui a conduta de conduzir um artifício daquela natureza a um estádio de futebol.
Visualizando a questão por um ângulo mais amplo, o mais relevante é a produção de uma racionalidade que possa nos conduzir à superação do problema da violência gratuita que se pratica em nome do futebol.
Nessa busca, mesmo reconhecendo a relevância do futebol na vida econômica e na construção da identidade cultural, como se dá, ademais, com diversas outras práticas sociais, ainda que ligadas ao aspecto restrito do lazer, há que se fixar o pressuposto de que o futebol sucumbe quando contraposto a outros valores fundamentais. No caso em concreto, fica muito evidente a fragilidade da importância do futebol diante do valor vida.
Perante uma situação como a que se verificou na Bolívia, o maior problema que pode advir se situa na tentativa de se encontrarem razões que minimizem o valor vida em prol do prosseguimento normal do esporte, ou, mais ainda, da continuidade incólume dos negócios do futebol. É um grande desserviço à humanidade pautar-se pela necessidade exclusiva de dar seguimento ao show, valendo-se, para tanto, de retóricas que tendam a transformar o ocorrido em mero incidente, expressando argumentos como os de que “uma pessoa sozinha não representa a torcida corinthiana”, que “o ato do torcedor não deve ser transferido ao clube”, que “não é a primeira vez nem será a última que alguém morre em um estádio de futebol”, que “uma punição ao Corinthians só seria válida se outros clubes envolvidos em fatos análogos já tivessem sido punidos” etc…
Bem ao contrário, a postura essencial para a extração de aprendizados evolutivos sobre o fato inicia-se com o reconhecimento de que a beleza do esporte, a relevância de torcer coletivamente por um clube e o exercício legítimo da competição em palco específico valem infinitamente menos que uma vida. Em nome do futebol não se podem justificar quaisquer violências contra a condição humana.
Esse reconhecimento impõe uma racionalidade que não acomode a situação e sim que afirme a sua gravidade e que busque soluções para a superação do contexto em que a violência se insere, independentemente da punição penal que se apresente ao responsável direto pela situação. É necessário, para todos e em especial para os torcedores do Corinthians, até para que não assumam a visão negativista da expressão “bando de loucos”, rechaçar todos os argumentos que, em prol da continuidade do show e dos negócios do futebol, vislumbrem transformar o fato ocorrido em um nada ou em um fato normal.
Os loucos pelo Corinthians e pelo futebol devem ser, antes de tudo, loucos pelo respeito aos valores humanos. Assim, cumpre reconhecer que a busca do título dessa Libertadores perdeu toda significação e independentemente de punição externa o Corinthians deveria deixar a competição, além de efetivar um gesto mínimo de ofertar indenização à família de Kevin Espada.
Convenhamos, seguir em frente, participando da competição como se nada tivesse ocorrido, é completamente sem propósito. Seguir, cumprindo a punição de jogar sem torcida, só tem o sentido da satisfação dos compromissos econômicos, pois jogar sem a torcida, do ponto de vista da lógica do esporte e da sua representação social, é, por si, um desvirtuamento pleno de sentido.
Mas, em vez disso, o Corinthians recorreu da decisão punitiva, que já era, vale destacar, bastante branda, rejeitando sua responsabilidade e, por conseqüência, minimizando a relevância social e humana da tragédia. E, de repente, surge uma versão que tem a sua coerência e os seus fundamentos, mas que também é bastante eficiente não apenas dar continuidade ao negócio esportivo como também para transformar o fato em uma circunstância isolada, advinda da ação de um “menimo” inconseqüente, favorecendo a manutenção das coisas exatamente como estavam, evitando punições e acreditando no rápido esquecimento…
Aos seres humanos corinthianos resta a postura mínima de dar adeus, expressamente, à Libertadores de 2013, sendo que se, por acaso, vier a ser demonstrado que a versão apresentada para o fato foi fruto de uma grande farsa, envolvendo pessoas e instituições (assumida, por óbvio, a presunção de que seja plenamente verdadeira, mas que em nada altera as conclusões anteriores), em vez de simplesmente desistir do futebol, como preconizou, com bastante dose de razão (e paixão), o jornalista, Juca Kfouri, já que um esporte que não respeita a vida e a dignidade das pessoas perde o sentido, será preciso, antes, exigir a punição de todos os que nela estejam envolvidos, pois que constituiria, por si, mais uma gravíssima violência.
(*) Professor da Faculdade de Direito da USP.

Brigas entre torcidas organizadas já mataram 155 pessoas

*  Os dados encontrados nesta pesquisa são até o ano de 2012

A guerra entre torcidas organizadas não é um problema somente da cidade de São Paulo, palco da morte de dois palmeirenses na semana retrasada.


Nem de Goiânia, capital onde faleceu um torcedor esmeraldino no sábado, 31 de março. Muito menos recente.


É uma questão nacional, antiga e que já soma 155 mortes em todo Brasil.


Da primeira morte de grande repercussão e impacto (Cleo, palmeirense, em 1988) até o assassinato de Diego Rodrigo, mais de uma centena de famílias já choraram a perda de seus filhos, irmãos, pais, sobrinhos, netos ou outros parentes.


Um número que parece exagerado para quem é exposto apenas ao noticiário de Rio de Janeiro e São Paulo, mas compatível com a selvageria que ocorre em todas as regiões.


A violência está espalhada pelo país, não escolhe cor dos clubes, sotaque das pessoas, costumes de cada local, nem tamanho da rivalidade. Acobertados pela impunidade, que faz com que poucos sejam presos, assassinos em busca de poder, vingança ou mais território tiram vidas sem receio.


Os jovens compõem a principal faixa etária dessas mortes, que são causadas normalmente por armas de fogo, devido à facilidade de execução e dificuldade de averiguação pela polícia.


Uma pesquisa divulgada na semana passada pela empresa Stochos Sports & Entertainment, especializada em marketing esportivo, revelou que 83% das pessoas acreditam que as facções organizadas são responsáveis pela diminuição de público nos estádios.




A PRIMEIRA


17 de outubro de 1988. O palmeirense Cléo Sostenes, que foi um dos presidentes da Mancha Verde, foi morto a tiros, supostamente por corintianos. É tido como primeiro caso de morte ligada ao futebol no Brasil.


Cléo virou uma espécie de símbolo para os membros da torcida. Seu rosto é pintado em bandeiras e paredes.




ÚLTIMA (por enquanto)


31 de março de 2012. Após 154 torcedores morrerem na guerra de facções pelo Brasil, foi a vez da família de Diego Rodrigo Costa de Jesus, de 23 anos, chorar. No último sábado, o jovem torcedor do Goiás morreu ao ser baleado por torcedores do rival Vila Nova, em Goiânia.




MORTES


Desde 1988, com uma morte, deparamos com um crescimento real e assustador, principalmente em 2007 e 2008, com 11 mortes em cada ano. Número que aumentou para 21 em 2009 e em 2010.


No ano seguinte, aconteceram mais 31 assassinatos e, até o momento, em 2012, 11 famílias choraram a perda de entes queridos por causa do futebol.




LOCAIS


Como é sabido, o problema é nacional e, nas grandes capitais, que abrigam os membros de torcidas organizadas de times de maiores expressões, o número é alarmante.


Em Belém, são oito mortes. Em Belo Horizonte, 11. Em Fortaleza, 14. No Rio, 19. São Paulo lidera a lista com 25. Em cidades da região, como Campinas, Limeira e Jundiaí, somam cinco assassinatos.


Porto Alegre tem apenas um caso de morte envolvendo torcidas.




FAIXA ETÁRIA


Os jovens são a imensa maioria. Até mesmo crianças de 11 a 15 anos fazem parte desta estatística, sendo os mais atingidos os de 16 anos (13), 17 anos (18), 19 anos (15) e 20 anos (10).


O mais velho havia completado 62 anos e quatro têm a idade desconhecida.




CAUSAS


As armas de fogo são as principais responsáveis pelas mortes, com 103, além da agressão (espancamento), que somam 39.

A economia das torcidas organizadas

POR LUIZ GUILHERME PIVA
As torcidas organizadas são empresas da economia informal.
Existem dois tipos de empresas na economia informal.
As do primeiro tipo são aquelas que, produzindo ou vendendo bens e serviços legais, escapam, o mais que possam, por necessidade ou esperteza, aos impostos, encargos, burocracias e responsabilidades legais.
Não estou falando de caixa dois, sonegação ou evasão praticadas por grandes empresas. E sim de pequenas empresas, empresas familiares ou individuais, ambulantes, autônomos, etc.
Nelas são recrutados produtores, trabalhadores, apoiadores e consumidores que, mesmo cometendo ilegalidades – ou, na definição mais rigorosa, crimes -, não são bandidos. Basta você consultar o dicionário para entender.
As empresas do segundo tipo são aquelas cujo produto é ilegal (armas, drogas, cópias de produtos, etc.) – tendo, pois, por natureza e finalidade, optado por elidir todas as normas, exceto, quase sempre, pela obtenção de um alvará de localização erma e/ou um CNPJ de fachada.
Obviamente, as empresas do segundo tipo recrutarão para seus negócios produtores, trabalhadores, administradores, financiadores, marqueteiros, comerciantes e consumidores que dão conteúdo ao verbete que você consultou há dois parágrafos.
As torcidas organizadas de futebol são empresas informais do segundo tipo.
O que elas vendem é ilegal.
Oferecem, vendem, entregam e asseguram o direito de exercer a violência, quer pela intimidação, quer pela agressão.
O produto delas é, por definição, monopólio do poder público.
O que define o Estado, ensinou Max Weber, é o monopólio do uso legítimo da força num determinado território. Se há grupos que, nesse território, conseguem fazer uso amplo e continuado da violência, o Estado está sendo questionado, ameaçado ou destruído.
É o caso de Estados em que, em determinadas circunstâncias, forças revolucionárias ou grupos golpistas ou bandos armados demarcam, de modo continuado, espaço e poder por meio do uso de armas ou da coerção em sentido amplo.
Revolucionários e golpistas obtêm mão-de-obra, anunciantes e clientes vendendo perspectivas de poder.
Traficantes vendem, caro, ascensão social para seus colaboradores e prazeres para seus clientes.
Torcidas organizadas vendem prestígio e proteção aos seus membros, que usufruem, com elas, do direito de exercer a violência.
Para seus clientes (jogadores, clubes, imprensa, dirigentes, torcedores adversários ou do mesmo time, etc.) vendem apoio, incentivo e – o mais valioso – um subproduto ou antiproduto (chantagem) do seu produto principal: não exercer, momentaneamente e a seu único critério, a violência contra eles.
É um business muito rentável.
Para os empreendedores, membros e acionistas de todos os tipos, rende, além de prestígio, dinheiro. Para os que aderem e financiam, defendem, enaltecem e reverenciam, garante o precioso usufruto do antiproduto.
Como em outras empresas, para que a rentabilidade se mantenha, é preciso que membros e clientes tenham demonstrações frequentes do poder do empreendimento: prêmios e bônus para os primeiros e vendetas exemplares contra os segundos que questionarem ou colocarem em risco o negócio.
Assim como outros negócios do mesmo tipo, como armas, drogas, falsificações de artigos caros, reproduções desautorizadas de patentes, segurança privada, justiça com as próprias mãos, emissão e circulação de moedas – todas elas atividades que contam com empreendedores, trabalhadores, distribuidores, anunciantes, financiadores, advogados, lobistas e consumidores -, também o business do exercício da violência à margem do Estado tem conquistado crescente lugar no mercado.
E, tal como alguns daqueles, qualquer dia – claro que também usando um nome fantasia, um empresário admirável como líder e uma lavanderia moderna como fachada – acabará constando desses rankings de maiores e melhores.

http://blogdojuca.uol.com.br/2013/03/a-economia-das-torcidas-organizadas/

terça-feira, 11 de junho de 2013

EU, ETIQUETA



EU, ETIQUETA 
Carlos Drummond

Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, premência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-lo por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer, principalmente.)
E nisto me comprazo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar,
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo de outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mar artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.


Fim de semana no parque. Racionais Mcs



Fim de Semana No Parque
Racionais Mc's
Compositor: Mano Brown/Edy Rock


" A TODA COMUNIDADE POBRE DA ZONA SUL"
Chegou fim de semana todos querem diversão
Só alegria nós estamos no verão, mês de Janeiro
São Paulo Zona Sul
Todo mundo a vontade calor céu azul
Eu quero aproveitar o sol
Encontrar os camaradas “prum” basquetebol
Não pega nada
Estou à 1 hora da minha quebrada
Logo mais, quero ver todos em paz
Um dois três carros na calçada
Feliz e agitada toda "prayboyzada"
As garagens abertas eles lavam os carros
Desperdiçam a água, eles fazem a festa
Vários estilos vagabundas, motocicletas
Coroa rico boca aberta, isca predileta
De verde florescente queimada sorridente
A mesma vaca loura circulando como sempre
Roda a banca dos playboys do Guarujá
Muitos manos se esquecem na minha não cresce
Sou assim e estou legal, até me leve a mal
Malicioso e realista sou eu Mano Brown
Me de 4 bons motivos pra não ser
Olha meu povo nas favelas e vai perceber
Daqui eu vejo uma caranga do ano
Toda equipada e o tiozinho guiando
Com seus filhos ao lado estão indo ao parque
Eufóricos brinquedos eletrônicos
Automaticamente eu imagino
A molecada lá da área como é que tá
Provavelmente correndo pra lá e pra cá
Jogando bola descalços nas ruas de terra
É, brincam do jeito que dá
Gritando palavrão é o jeito deles
Eles não tem video-game às vezes nem televisão
Mas todos eles têm um dom São Cosme São Damião
A única proteção.
No último natal papai Noel escondeu um brinquedo
Prateado, brilhava no meio do mato
Um menininho de 10 anos achou o presente,
Era de ferro com 12 balas no pente
E fim de ano foi melhor pra muita gente
Eles também gostariam de ter bicicleta
De ver seu pai fazendo cooper tipo atleta
Gostam de ir ao parque e se divertir
E que alguém os ensinasse a dirigir
Mas eles só querem paz e mesmo assim é um sonho
Fim de semana do Parque Sto. Antônio.

(Refrão):
Vamos passear no Parque
Deixa o menino brincar
Fim de Semana no parque
Vou rezar pra esse domingo não chover

Olha só aquele clube que da hora
Olha aquela quadra, olha aquele campo
Olha, Olha quanta gente
Tem sorveteria cinema piscina quente
Olha quanto boy, olha quanta mina
Afoga essa vaca dentro da piscina
Tem corrida de kart dá pra ver
É igualzinho o que eu vi ontem na TV
Olha só aquele clube que da hora,
Olha o pretinho vendo tudo do lado de fora
Nem se lembra do dinheiro que tem que levar
Do seu pai bem louco gritando dentro do bar
Nem se lembra de ontem, de hoje e o futuro
Ele apenas sonha através do muro...
Milhares de casas amontoadas
Ruas de terra esse é o morro
A minha área me espera
Gritaria na feira (vamos chegando!)
Pode crer eu gosto disso mais calor humano
Na periferia a alegria é igual
É quase meio dia a euforia é geral
É lá que moram meus irmãos meus amigos
E a maioria por aqui se parece comigo
E eu também sou bam bam bam e o que manda
O pessoal desde às 10 da manhã está no samba
Preste atenção no repique atenção no acorde
(Como é que é Mano Brown?)
Pode crer pela ordem
A número 1 de baixa renda da cidade
Comunidade Zona Sul é dignidade
Tem um corpo no escadão a tiazinha desce o morro
Polícia a morte, polícia socorro
Aqui não vejo nenhum clube poliesportivo
Pra molecada frequentar nenhum incentivo
O investimento no lazer é muito escasso
O centro comunitário é um fracasso
Mas aí se quiser se destruir está no lugar certo
Tem bebida e cocaína sempre por perto
A cada esquina 100 200 metros
Nem sempre é bom ser esperto
Schimth, Taurus, Rossi, Dreyer ou Campari
Pronúncia agradável estrago inevitável
Nomes estrangeiros que estão no nosso meio pra matar M.E.R.D.A.
Como se fosse ontem ainda me lembro
7 horas sábado 4 de Dezembro
Uma bala uma moto com 2 imbecis
Mataram nosso mano que fazia o morro mais feliz
E indiretamente ainda faz, mano Rogério esteja em paz
Vigiando lá de cima
A molecada do Parque Regina
(Refrão)
Tô cansado dessa porra de toda essa bobagem
Alcoolismo, vingança treta malandragem
Mãe angustiada filho problemático
Famílias destruídas fins de semana trágicos
O sistema quer isso a molecada tem que aprender
Fim de semana no Parque Ipê
(Refrão)
"Pode crer Racionais Mc's e Negritude Junior juntos
Vamos investir em nós mesmos mantendo distância das
Drogas e do álcool.
Aí rapaziada do Parque Ipê, Jd. São Luiz, Jd. Ingá, Parque Araríba, Váz de Lima
Morro do Piolho e Vale das Virtudes e Pirajussara
É isso aí mano Brown (é isso ai Netinho paz à todos)"